Quem Lê, Lê para quê?
Quem lê, lê para quê? Para encontrar, ou para encontrar-se? Quando o leitor assoma à entrada de um livro, é para conhecê-lo, ou para se reconhecer a si mesmo nele? Quer o leitor que a leitura seja uma viagem de descobridor pelo mundo do poeta (designo agora por poesia, se mo permitem, todo o trabalho literário), ou, sem o querer confessar, suspeita que essa viagem não será mais do que um simples pisar novo das suas próprias e conhecidas veredas? Não serão o escritor e o leitor como dois mapas de estradas de paÃses ou regiões diferentes que, ao sobreporem-se, tornados até certo ponto, um e outro, transparentes pela leitura, se limitam a coincidir algumas vezes em troços mais ou menos longos de caminho, deixando, inacessÃveis e secretos, espaços não comunicantes, por onde apenas circularão, sozinhos, sem companhia, o escritor na sua escrita, o leitor na sua leitura?
José Saramago, in 'Último Caderno de Lanzarote'