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Opinião de Leitura
Este País Não É para Velhos Este País Não É para Velhos

Autor: McCarthy, Cormac

Leitor: Paulo Neves da Silva

Opinião

Moss, um veterano atirador de elite da guerra do Vietname que vive uma existência pacata como soldador, depara-se, numa das suas caçadas na zona de fronteira entre os Estados Unidos e o México, com um espectáculo macabro de corpos e carros baleados e uma mala de dois milhões de dólares. Ao apoderar-se do dinheiro, provoca o início de uma autêntica caça ao homem, sendo perseguido por todo o lado sem descanso, continuando a morrer gente dos dois lados da operação de tráfico de droga fruto dos vários encontros e tiroteios que vão acontecendo, enquanto Bell, xerife do condado de Moss, tenta a todo o custo evitar o destino fatal que espera este homem, ainda para mais perseguido por um assassino psicopata, Chigurh, que massacra de forma bárbara toda a gente que se intromete no seu caminho.

De assassinato em assassinato, Chigurh prega a sua própria moral, não tendo nunca inimigos por nenhum deles estar (ou ficar) vivo, matando rivais e inocentes de preferência com tiros na cara, alguns deles precedidos de discursos macabros, invocando-se como bastião da coerência num mundo onde, tal como a própria Natureza, apenas se limita o cumprir o seu papel sem excepções. Vítima de alguma ingenuidade apesar do seu carácter duro, a obstinação de Moss tem um adversário invencível pela sua frente, que, não contente em simplesmente apanhar o dinheiro, faz questão de o vir a devolver ao seu dono como prova de uma lealdade absurda num mundo de confrontos sanguinolentos que gira em volta do comércio de droga.

É neste cenário de filme hollywoodesco que decorre este romance, que cedo mostra não ser apenas um excelente argumento para um bom filme policial, mas também um grande livro tanto pela técnica singular de narrativa do seu autor, objectiva e resumida e que em simultâneo deixa o leitor ávido de ler a página seguinte, como pelo simbolismo da própria narrativa e das suas personagens, com ênfase no xerife Bell, que de forma lúcida e ponteada ao longo do romance (em monólogos no início de cada capítulo) descreve o estado da sociedade actual, destacando a desorientação geral que observa na juventude e o desajustamento dos mais velhos ao mundo de hoje por já não se reconhecerem no mesmo, antevisão de um apocalipse próximo.

Comentários

Opinião interessante de André Moura e Cunha em:
http://amc-ausencia.blogspot.com/2007/12/brutalidades-i.html

Excerto

Ela soluçava. Abanou a cabeça.
E todavia, embora eu te pudesse ter dito de antemão como é que tudo isto iria terminar, achei que não era excessivo proporcionar-te um derradeiro lampejo de esperança neste mundo, para te alegrar o coração antes que tombe o véu, as trevas. Compreendes?
Oh, meu Deus, disse ela . Oh, meu Deus.
Sinto muito.
Ela olhou-o pela derradeira vez. Não és obrigado, disse. Não és. Não és.
Ele abanou a cabeça. Estás a pedir-me que me torne vulnerável, e isso é coisa que eu nunca poderei fazer. Só tenho uma maneira de viver, que não admite casos excepcionais. Uma moeda ao ar, no máximo. Sem grande utilidade, neste caso. A maioria das pessoas não acredita que possa existir alguém assim. Isso deve constituir para elas um grande problema, como facilmente entenderás. Como levar a melhor sobre uma coisa cuja existência nos recusamos a reconhecer. Compreendes? Assim que eu entrei na tua vida, a tua vida terminou. Teve um começo, um meio e um fim. O fim é agora. Dirás que as coisas podiam ter sido diferentes. Que podiam ter corrido de outra maneira. Mas o que é que isso significa? As coisas não correram de outra maneira. Correram desta. Estás a pedir-me que desminta o mundo. Percebes?
Sim, disse ela, a soluçar. Percebo. A sério que percebo.
Ainda bem, disse ele. Óptimo. Depois deu-lhe um tiro.

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