O Limite Saudável do Amor por Nós Próprios
O amor por nós mesmos, que só a nós diz respeito, sente-se satisÂfeito quando as nossas verdadeiras necessidades ficam satisfeitas; mas o amor-próprio - que se pretende comparar com ele - nunÂca se sente satisfeito nem o poderia estar, porque esse sentimenÂto, que nos leva a preferirmo-nos aos outros, também exige que os outros nos prefiram a eles próprios; ora isso é impossÃvel. Eis coÂmo as paixões suaves e afectuosas têm origem no amor por si próÂprio, e como as paixões de ódio e de ira provêm do amor-próprio. Assim, o que torna o homem essencialmente bom é o facto de ter poucas necessidades e de pouco se comparar com os outros; o que o torna essencialmente mau é ter muitas necessidades e preoÂcupar-se muito com a opinião. Sobre este princÃpio, é fácil ver coÂmo se podem dirigir - para o bem ou para o mal - todas as paiÂxões das crianças e dos homens. É verdade que, como não podem viver sempre sós, dificilmente poderão viver sempre bons: e esta dificuldade aumentará, necessariamente, com o alargamento das suas relações; e é nisso, sobretudo, que os perigos da sociedade nos tornam a arte e os cuidados mais indispensáveis para prevenir - no coração humano - a depravação originada pelas suas novas neÂcessidades.
Jean-Jacques Rousseau, in 'EmÃlio'