Ainda não tendes advertido, que a inveja faz grande diferença dos mortos aos vivos, e dos presentes aos passados? Os olhos da inveja são como os do Sacerdote Heli, dos quais diz o Texto sagrado, que não podiam ver a luz do Templo, senão depois que se apagava: Oculi ejus caligaverant, nec poterat videre lucernam Dei, antequam extingueretur. Enquanto as luzes são vivas, cada reflexo delas é um raio, que cega os olhos da inveja: porém depois que elas se apagaram, e muito mais se se metem largos anos em meio, então abre a inveja, como ave nocturna, os olhos; então vê o que não podia ver: então venera e celebra essas mesmas luzes, e levanta sobre as Estrelas seus resplendores. Por isso disse com grande juízo S. Zeno Veronense, que todo o invejoso é inimigo dos presentes, e amigo dos passados: In omnibus se inimicum praesentium servat, amicum vero pereuntium. Os mesmos que agora amam, e veneram tanto a Santo António, se viveram em seu tempo, o haviam de aborrecer e perseguir; e as mesmas maravilhas, que tanto celebram e encarecem, se foram obradas na sua Pátria, as haviam de escurecer e aniquilar.

Padre António Vieira, in "Sermões"

1. A Cegueira da Governação
2. Em Portugal cada um Quer Tudo
3. O Amor Fino
4. Todo o Amor é Imaginário
5. Muito Tempo Há que a Mentira se Tem Posto em Pés de Verdade
6. A Maior Parte do que Sabemos é a Menor do que Ignoramos
7. Somos Pó
8. Amar ou Ser Amado?
9. Ao Lado do Ofício de Mandar Deve Andar o de Sugerir
10. Cegueira de Olhos Abertos
11. O Amor Vulgar
12. O Primeiro Amor
13. A Inveja não tem Passado
14. Ver e não Ver
15. A Inveja é a Espada que Mais Corta
16. O Mundo Está tão Cheio de Livros como Falto de Verdades
17. As Quatro Ignorâncias do Amante
18. Para Um Homem Se Ver a Si Mesmo
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