O Excesso de Conhecimento sem Discernimento
Herdamos conhecimentos e invenções de todos os séculos; ficamos portanto mais ricos em bens do espÃrito: isso não nos pode ser contestado sem injustiça. Mas estarÃamos nós próprios enganados se confundÃssemos essa riqueza herdada e de empréstimo com o génio que a dá. Quantos desses conhecimentos adquiridos são estéreis para nós! Estranhos no nosso espÃrito onde não tiveram origem, acontece muitas vezes que eles confundem o nosso juÃzo muito mais do que o esclarecem. Arcamos sob o peso de tantas ideias, como aqueles estados que sucumbem por excesso de conquistas e em que a opulência introduz novos vÃcios e desordens mais terrÃveis; porque pouca gente é capaz de fazer bom uso do espÃrito alheio.
(...) O efeito das opiniões multiplicadas além das forças do espÃrito é produzir contradições e abalar a certeza dos melhores princÃpios. Os objectos apresentados sob um número excessivo de faces não se podem organizar, nem desenvolver, nem pintar distintamente na imaginação dos homens. Incapazes de conciliar todas as suas ideias, tomam os diversos lados de uma mesma coisa como contradições da sua natureza. Vários não querem comparar a opinião dos filósofos. Não examinam se na oposição dos seus princÃpios, alguém fez pender a balança para o seu lado; basta que se tenham contestado todos os princÃpios para que os julguem igualmente problemáticos: daà o pirronismo que volta a mergulhar o espÃrito humano na ignorância, porque ele solapa, pela base, todas as ciências.
Luc de Clapiers Vauvenargues, in 'Das Leis do EspÃrito'