Rafael Chirbes

Espanha
27 Jun 1949 // 15 Ago 2015
Escritor

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O Mundo Já Foi Descoberto algum Tempo Antes

Todas as juventudes se parecem umas com as outras, é na maturidade que começa a diferença, distinguimo-nos pela maneira como resolvemos essa inquietação original, como abordamos a encruzilhada dos caminhos com que a saída da juventude nos confronta. O tempo que perdemos, A impossibilidade de o recuperarmos. Não sabermos ao certo se o que fizemos foi perder ou ganhar. Nunca sabemos se há outra forma de amadurecer que não seja perdendo todo esse tempo, empenhando-nos nessas discussões «pour critiquer le monde avec désinvolture», com o eu sempre na dianteira, o eu como bandeira e como objectivo, embora a vida acabe depois por passar ao lado. E o meu genro não se dá conta: esta gente nunca quis saber de onde lhes vieram as coisas. Todos saímos de um magma originário, conhecemo-nos numa mesma caldeira e numa água parecida, mas acontece que depois a vida foi-nos canalizando sem que decerto nós próprios tivéssemos grande a coisa a ver com isso. Fazemos coisas, mas há qualquer coisa, um mecanismo, que é mais forte do que as coisas que podemos fazer. Foi o que disse no seu momento a Matias, foi o que disse à minha filha: Quando as ideias não nos deixam ver a realidade, não são ideias, são mentiras. Dizer simplesmente a Silvia: Há mecanismos que aí estiveram desde a eternidade. Os jovens esforçam-se sempre por fazer com que os mais velhos participem da sua estupefacção, da sua grande novidade: começaram a descobrir o mundo. Mas o mundo já foi descoberto algum tempo antes. Os velhos sabem-no, nós sabemo-lo.

Rafael Chirbes, in 'Crematório'




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