Depois, Al-Mitra falou, dizendo «Pedíamos agora que nos falasses sobre a Morte.»
E ele disse:
Quereis saber o segredo da morte,
mas como podereis encontrá-lo senão procurando-o no coração da vida?
A coruja, cujos olhos destinados à noite são cegos à luz do dia, não consegue desvendar o mistério da luz.
Se quereis, de facto, contemplar o espírito da morte, abri completamente o vosso coração ao corpo da vida.
Pois vida e morte são uma, tal como o rio e o mar são um.
Nas profundezas das vossas esperanças e desejos repousa o vosso silencioso conhecimento do além;
E, tal como as sementes sonham sob a neve, assim também o vosso coração sonha com a primavera.
Confiai nos sonhos, pois neles está escondido o portão da eternidade.
O vosso medo da morte não é senão o tremor do pastor, quando se encontra em frente ao rei cuja mão assentará sobre ele em sinal de honra.
Não estará o pastor contente apesar do seu medo, porque irá exibir a marca do rei?
No entanto, não estará ele mais atento ao seu tremor?
Pois o que é morrer senão estar despido ao vento e derreter ao sol?
E o que é parar de respirar senão libertar o sopro das suas incansáveis marés, a fim de que possa elevar-se e expandir-se, buscando Deus em liberdade?
Apenas quando beberdes do rio do silêncio podereis cantar de autenticamente.
E quando chegardes ao topo da montanha, então é que começareis a subir.
E só quando a terra reclamar os vossos membros, é que podereis dançar verdadeiramente.
Khalil Gibran, in 'O Grande Livro do Amor (tradução de José Luís Nunes Martins)'